-
Arquitetos: Mariana Alves Barbosa, Victor Piza, Vinicius da Costa
- Área: 76 m²
- Ano: 2022
-
Fotografias:Carolina Lacaz
Descrição enviada pela equipe de projeto. O Conjunto Residencial 9 de Julho foi inaugurado em 1950. Trata-se de um conjunto modernista de três edifícios dispostos no encontro da Av. 9 de Julho com a Av. São Gabriel. Quando o terreno foi adquirido pelo IAPB (Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários), essas avenidas ainda não existiam em 1938, e o que foi pensado para ser um, foi partido em três diferentes endereços nos limites do Jardim Europa, Jardim Paulista e Itaim Bibi.
O movimento das avenidas hoje corrobora com a ideia antiga de cidade protagonizada pelos transportes. Além do trânsito geralmente carregado, o movimento dos ônibus é especialmente marcante – não só pela quantidade, já que por ali passam importantes linhas que ligam densos bairros da zona sul ao centro da cidade, mas também pelo som que produzem. A poluição sonora e todo o movimento das avenidas que desenha as fachadas dos prédios foram temas que a princípio se apresentaram como desafios imponentes para trabalhar o morar nesta região – mas não para o Apartamento 13. Ao entrar no imóvel, disposto em andar baixo e de localização ímpar, o silêncio se apresentou de maneira quase inacreditável. Em fachada noroeste e voltada para os fundos do prédio, longe do movimento da 9 de julho, a vista encontra uma fronteira de árvores verdes que define a paisagem das janelas do apartamento, diante de um bairro protegido por legislações ambientais e órgãos de defesa do patrimônio histórico.
O apartamento trazia de forma inerente um modo de vida de antes, já esvaziado de sentido prático do morar para este caso: o acesso à cozinha confundia-se com os acessos aos quartos – dela, lavanderia e entrada de serviço do apartamento se dispunham longe de qualquer outro uso. A sala generosa, destacada de todos os demais cômodos da casa, estrelava como o único espaço social – local com o acesso principal e regada com a iluminação única de uma generosa janela. Este apartamento faz pensar que o espaço seria mais precisamente medido por volume e não por área. O pé direito de três metros é fator primordial para a qualidade do lugar, que o faz parecer maior e mais aerado.
O vazio, a luz, o silêncio e a busca pela paisagem foram pilares que organizaram o partido de projeto, que se materializou através de estratégias como o redesenho dos fluxos, dos usos e das vistas do apartamento, tendo como principal fator de demolição uma abertura entre cozinha e sala, integrando-as em um espaço social categórico - onde a elegante e antiga janela angulada da cozinha encontra o verde da janela da sala e garantem troca de ar em cruze, mantendo a temperatura agradável mesmo nos dias mais quentes. A inversão da cozinha com a lavanderia permitiu a ampliação da área social, além de levar a lavanderia para mais perto do quarto e banheiros, uma vez que se trata de local irradiador de limpeza, serviço que se comunica essencialmente com os locais de que se aproxima. Tal gesto permitiu, também, o surgimento de dois percursos independentes com finalidades diferentes, apesar de comunicados em circuito.
O apartamento se dobra ao meio. Se de um lado temos a reconstrução total de áreas molhadas – cozinha, lavanderia, lavabo e banheiro – no outro lado temos apenas recuperações pontuais do existente – quarto, escritório e sala. Estes dois momentos se encontram no corredor principal e contrastam em seus desenhos. O lado antigo se manteve com o desenho do batente original do prédio, apesar de pintado. Já as novas aberturas se escondem atrás de longas portas de correr de vidro canelado que deslizam em caixilhos metálicos ao longo de toda a área de intervenção. Os batentes removidos foram descascados, recuperando o tom original da madeira peroba-rosa empregada há mais de 70 anos, para agora servir a outro propósito: construir a cabeceira da cama. Outro objeto de recuperação foi o piso da área seca – os tacos de madeira previstos pelo projeto original do prédio. Já o novo piso de toda área molhada apostou mais uma vez no contraste – diferente da delicadeza dos tacos, são feitos em material ultra resistente, de característica industrial e de fácil manutenção. O novo piso, e os demais revestimentos propostos para os banheiros, aludem aos antigos vestiários de complexos aquáticos ou até mesmo ao revestimento de piscinas, em sintonia com uma das paixões da cliente, a natação.
Mobiliário independente, cores e um lugar de destaque para a sua bicicleta – outra paixão – também foram solicitações da cliente, arquiteta e filha de arquiteto, que teve sua infância contextualizada por um modernismo paulista. As cores empregadas vieram de uma paleta referenciada na atmosfera das Case Study Houses, da mesma época do prédio, e a modulação do mobiliário, tanto no aspecto de desenho e ritmo, quanto na elaboração factual de módulos independentes para o banheiro principal, sala e cozinha, atenderam à flexibilidade requerida, colaborando na construção de uma identidade de desenho para o apartamento.
A iluminação do apartamento aparece essencialmente de forma discreta, fugindo dos centros e dos tetos. Nos corredores e cozinha, aparecem quase como contorno discreto da arquitetura, seguindo de forma linear os desenhos projetados e emitindo iluminação indireta, dando profundidade aos espaços. Pendentes singulares foram utilizados na sala e no quarto, como forma de afirmar o uso destinado ao que é iluminado. Na sala, o pendente circular desenhado pela arquiteta e designer Mel Kawahara posiciona-se sobre a redonda mesa de jantar. Já no quarto, o pendente linear descentralizado ilumina a área de troca de roupas, junto ao guarda-roupas.